Pequenas Grandes Coisas da Minha Vida Sueca #15

A primavera deu as caras por esses dias: estamos acima dos 10 graus C minha gente! E tudo indica que ficaremos por ali… hehe. Mas é super, não dá realmente para explicar. Todos mundo me dizia que eu entenderia a felicidade do povo sueco quando o termômetro atinge essa marca insignificante aos olhos brasileiros depois do meu primeiro inverno aqui, e veja só, é verdade. Isso que meu primeiro inverno sueco não foi um “daqueles” invernos – como a Mari e a Paula experimentaram – mas eu me sinto imensamente satisfeita com esse calorzinho.

Ontem tivemos 15 graus e eu e Joel nos aventuramos a beira mar. Ventava muito, o vento a beira mar é super gelado mas eu me senti quase no verão: céu azul, eu com apenas dois casacos, uma sensação maravilhosa de liberdade! Entrei na onda e agora eu sou mais uma entre os entusiasmados suecos que comemoram os 10 graus C. É muito lindo: as pessoas parecem mais sorridentes e até mesmo as árvores parecem contentes ao exibir suas novas folhas verdes e flores.

No trabalho o Zé começou a ouvir um CD com músicas de verão. E qual não foi a minha surpresa ao ouvir uma versão do Biquíni de Bolinha Amarelinha em sueco? Na verdade, a versão original da canção é dos Estados Unidos (com o nome Itsy Bitsy Teeny Weeny Yellow Polka Dot Bikini, e eles falam de um biquini normal! haha), que ganhou o mundo em várias versões na década de 60, no Brasil na voz de Celly Campelo.

Eu já comentei que as calcinhas suecas são enormes, mas acho que não dá para explicar sem mostrar. Em todo o caso eu tenho uma amiga que foi para o Brasil e levou umas amigas suecas e me contou que as suecas ficaram horrorizadas com o tamanho do biquíni brasileiro (sim, aqui elas tapam a bunda inteira e os seios inteiros quando não fazem topless). Não quero ser repetitiva, mas o que quero deixar claro é que uma calcinha sueca, ainda que fio dental, vai ter mais pano do que a calcinha convencional brasileira. É uma contradição inexplicável, uma vez que quando a gente vai para um local de banho (próximo a um lago ou numa praia) não há cabines para trocar de roupa e todo mundo fica ensaiando uma coreografia louca com a toalha de banho – mostra aqui, tapa lá, puxa para o lado, opa! foi muito, volta agora para baixo…  – mas as crianças em geral ficam peladinhas, e eu já vi mulher grávida se trocando sem toalha alguma e sem nenhum pingo de vergonha: só e simplesmente ela tirou a calcinha e colocou a calcinha do biquíni, depois tirou o sutiã e colocou o sutiã do biquíni…

Eu uso um biquíni normal. Mesmo assim quando fui nadar com a Frida e a Liv tinha uma monte de gente olhando para mim como se eu estivesse pelada. Não, definitivamente não foi porque essa brasileira aqui – apesar de não ser mulata – é muito linda (minha modéstia me consome) – afinal, eu engordei quase 3 quilos depois que mudei, e esse três quilos foram parar só na barriga! Foi por causa do tamanho do meu biquíni! Hahahaha – ah se ele fosse amarelo!

E com vocês, direto de 1961, Lil Babs com…

O coro masculino é em norueguês, e eles perguntam: 1, 2, 3 o que a gente não pode ver? O restante da música segue o mesmo padrão da versão em português…

Trava língua sueco!

Eu tinha 20 diferentes trava línguas (como se escreve o plural disso?) que eu achava o maior barato, entre eles os populares “O peito do pé do Pedro é preto”, “Três pratos de trigo para três tigres tristes” , “Num ninho de mafagafos há cinco mafagafinhos, quem os desmafagafizar bom desmafagafizador será!” e “O rato roeu a roupa do rei de Roma e a rainha raivosa rasgou o resto”. O meu preferido é a conjunção do verbo tagarelar no futuro do pretérito. Tente aí:

Eu tagarelaria. 
Tu tagarelarias.
Ele tagarelaria.
Nós tagarelaríamos.
Vós tagarelaríeis.
Nós tagarelaríamos.
 

Semana passada uma moça no meu trabalho me perguntou se eu já havia tentado algum trava língua sueco e eu respondi que sim, desde que comecei a aprender os sons do sueco – que são um verdadeiro trava línguas – afinal, a gente engasga volta e meia com a pronúncia das combinações silábicas…  A primeira vez que tentei falar enfermeira (sjuksjöterska – algo como ruik- ruoe-texcá) e aproveitar (utnyttia) enrolei legal a língua – ainda enrolo para falar a última. Quando encontrei Joel no Brasil ele me ensinou hypernevrokustiskadifragmakontravibrationer, que é o nome científico para soluço – soluço mesmo em sueco é apenas hika. Nem é tão difícil se você separar todas as palavras do qual ele é composto: hyper – nevro – kustiska – diafragma – kontra – vibrationer (diga “nevru” e “vibrarruner”, as demais palavras tem a pronúncia bem próxima do português).

Trava língua em sueco é um tungvrickning ou tungvrickraretung é língua e vrickning/vrickare é torcer como quando torcemos um tornozelo ou braço, ou seja, dobrar ou virar algo com violência. Alguns a primeira vista não parecem tão difíceis mas como o objetivo é a repetição rápida daí o trem enrola mesmo e é aí que nascem as frases engraçadas. Vou deixar alguns exemplos aqui, com o significado em português:

1. Barbros bror badade bara i Barsebäck. (O irmão do Barbro tomava banho apenas em Barsebäck).

2. Ett pepparkorn i en kopparpanna. Två pepparkorn i en kopparpanna. Tre pepparkorn… (Um grão de pimenta em uma chaleira de cobre. Dois grãos de pimenta…).

3. Flyg, fula fluga, flyg. Och den fula flugan flög. (Voe, feia mosca, voe. E a mosca feia voou).

4. Far, får får får? Nej, får får inte får, får får lamm.(Pai, ovelhas tem ovelhas? Não, ovelhas não tem ovelhas, ovelhas tem cordeiros. Isso para mim soa como: Fór, fôr fôr fôr? Nei, fôr fôr inte fôr, fôr fôr lam).

5Sotaren Selma samlar semlor. Se så många semlor Selma samlat. (A Selma limpadora de chaminés junta doces. Veja quantos doces Selma juntou).

6. Sex vaxade laxar i en vaxad laxask. (Seis salmões encerados em uma caixa encerada… non sense).

7. Hellre en hängmatta i parken än hängpattar i marken. (Mais vale uma rede no parque do que seios caídos… hummm, com certeza).

8. Ställ stoet i stallet i Stöllet istället din stolle! (Coloque a égua no celeiro seu idiota! Essa é censurada para menores de 12 anos…)

9. Hans Hanssons halta höna hade en hiskelig hosta hela härliga hösten. (A galinha manca do Hans Hansson teve uma tosse histérica todo o maravilhoso outono. HahaHahahaha! Quanta imaginação!).

10. Packa pappas kappsäck med åtta pepparkorn. (Coloque oito grãos de pimenta na mala do papai. Os grãos de pimenta são top).

11. Pappa hänger upp hinkar i taket. (Papai pendura baldes no teto. Quando se repete muitas vezes acaba virando um “papai mija no teto”).

12. Sju skönsjungande sjuksköterskor skötte sjuttiosju sjösjuka sjömän på skeppet Shanghai. (Esse é com certeza o pior de todos: sete enfermeiras cantando lindamente cuidaram de setenta e sete marinheiros mareados no navio em Shangai – ufa!)

Apesar de ser complicado – o som do “ö”  e do “sj”, por exemplo, são tipicamente suecos – encontrei um vídeo de um nativo inglês tentando (obviamente, a voz de fundo é a voz de um sueco):

Quem sabe eu faça um vídeo e tente também… hahahaha, nãoooooooooo!

Profissão: Assistente Social

Tem algumas coisas que a gente passa como estrangeiro que, simplesmente, não tem noção: ontem tava no trabalho com o Zé (tipo uma escola, uma APAE) e ele queria uma imagem da internet; fui perguntar para o pessoal qual computador a gente poderia utilizar para isto e a Sra. Monitora veio com essa “Você sabe lidar com computadores?”! Na hora me senti uma pimenta mas respirei fundo e deu um simples sim com um sorriso – meu sorriso anda tão falso que eu poderia trabalhar para uma agiota – mas no fundo a idéia seria gritar.

Eu ando meio sensível com essa questão das minhas habilidades “profissionais”. Eu sou assistente social e trabalhei com isso por cinco anos, mas quando o gato come a “língua da gente” simplesmente não dá para mostrar o que você é e sabe com tanta facilidade como quando temos a língua no lugar. Então chega uma Sra. Monitora e faz uma pergunta simples (mas ridícula ao mesmo tempo) e eu entro direto no modo “combate”. Agora eu penso que ela poderia ter perguntado isso simplesmente porque ela não poderia encontrar uma imagem na internet, redimensionar, recortar – se preciso e imprimir; mas na hora me deu uma “reiva danada” e tudo o que eu queria era gritar: “hallå! Estrangeiro não é sinônimo para “retardado”!” Não que eu pense que pessoas que não podem entender computadores sejam retardadas, mas qual é o indivíduo com menos de 30 – 35 anos que não pode mexer com esse trem?????

Por um tempo em que trabalhei na Prefeitura em Maripá tive uma máquina muito velha com XP instalado. Isso significa um computador muito lento, que travava muito e que sumia com meu trabalho volta e meia, quando não cortava os downloads e uploads que eu tinha de enviar pela internet. Eu sempre tinha de fazer as coisas duas vezes e meia para conseguir algum resultado. Durante esse tempo falei com a minha chefe sobre isso – porque os computadores seriam trocados, mas processos de licitação duram séculos – e só informei que tentaria melhorar a máquina. Sei muito pouco sobre software e hadware, mas entrei para o Clube do Hardware  e comecei a mudar uma série de configurações do sistema: bons resultados, ótimo; mau resultado, desfazia o processo ou esperava… enfim “eu” iria ganhar um computador novo em alguns (muitos) meses.

Quando sai do meu trabalho sai apenas porque iria mudar. Eu tinha uma vida muito simples e tranquila e no meu mundo trabalhar na prefeitura era algo muito bom: sábado e domingo livres, ficava por dentro de praticamente tudo que era novo dentro da área do Serviço Social – Serviço Social no Brasil ainda é do governo – de graça e sem esforço, salário bom (para quem é sozinho)… O maiores entraves sempre foram a falta de recursos e picuinhas políticas: quando o Lula se tornou presidente conseguiram aprovar o Sistema Único de Assistência Social (política que estava sendo cozinhada há algum tempo, para variar) e isso vinha – acredito que ainda vem – ajudando a tornar o papel do assistente social mais claro e definido dentro das partições públicas.

Hoje li no Facebook que aprovaram uma lei para que as escolas públicas contem com uma comissão formada por assistente sociais e psicólogos. Que lindo… não há nem professores suficientes nas escolas, agora vão colocar um assistente social e um psicologo para resolver os problemas – que na maioria das vezes são administrativos ou familiares – dentro da escola. Bom para nós assistentes sociais que “conquistamos” mais um campo de trabalho de graça; ruim para nós assistentes sociais que vivemos para descascar o abacaxi dos outros.

Talvez seja importante, mas não agora. Não temos assistentes sociais trabalhando nos juizados de menores, na verdade não há assistentes sociais trabalhando no judiciário brasileiro – eu e mais outras muitas assistentes sociais fomos forçadas a trabalhar de graça para a Comarca de Palotina, e isso não acontece apenas na Comarca de Palotina – Paraná – Brasil… Nem um juiz sabe qual o papel de uma assistente social, o que esperar do restante da população? Assistente social não é para resolver problema de pobre, assistente social não é para dar o bolsa família ou cesta básica, assistente social não é definitivamente para dar qualquer coisa para gente miserável: assistente social é para fazer valer o direito de qualquer cidadão, seja ele pobre ou não – o caso é que no Brasil o foco está somente nessa área da população.

Aqui na Suécia assistente social atende criança, adolescente, homem, mulher, velho, homossexual, dependente químico e estrangeiro, indiferente de “classe social”. E não é porque é Suécia, porque é Europa, ou porque é primeiro mundo: é porque aqui se tem respeito para com o profissional assistente social, e está muito claro o que é da alçada dele ou não. Não existem assistentes sociais que trabalham de graça para o judiciário sueco aqui não.

No mesmo setor que eu trabalhava havia outra assistente social chamada Angela e ela sempre repetia que “quando alguém não sabe o que fazer com determinada situação, empurra para o Serviço Social”. No caso das escolas, é isso que está acontecendo: cada vez mais as crianças são agrupadas dentro de “sintomas” – esse é hiperativo, esse é disléxico, vamos ver… esse é um pouco avoado, mas vamos colocar ele no grupo “dificuldade de aprendizado”…; resultado de traumas de “famílias desestruturadas”. Vamos tomar vergonha na cara meu povo, desde quando mãe e pai com preguiça de educar o filho é família desestruturada? Ou pior, desde quando somente as famílias pobres é que são famílias desestruturadas?

Exatamente isso, só as famílias pobres tem problemas, e são para os pobres que nós, assistentes sociais, trabalhamos e continuaremos trabalhando. Ou tem algum filho de deputado/senador estudando em escola municipal/colégio estadual? Se ter uma equipe “multidisciplinar nas escolas”, formada por assistente social + psicólogo, é assim tão bom por que as escolas privadas brasileiras não precisam de uma equipe dessas? Por que a lei será aplicada para as escolas públicas? E por qual salário, minhas colegas de profissão, seremos submetidas a isto? E vamos trabalhar as 30h da lei que foi aprovada/reprovada…? E nas escolas que funcionam 60h por semana, quantas equipes existirão? Por quantos alunos cada assistente social e psicóloga será responsável?

Tem gente comemorando no Brasil, e eu não entendi porquê.

Pequenas Grandes Coisas da Minha Vida Sueca #14

Esse foi o primeiro fim de semana desse ano em que não trabalhei nem na sexta e nem no sábado. To me sentindo… gripada. Claro que tinha que coroar o feito de alguma forma, mas tá valendo porque não é aquela gripe. Não sei se fico feliz ou triste com isso, afinal, estava prometendo a pelo menos três semanas me pegar – a gripe – e chegou meio assim com preguiça. Tomara que não demore três semanas para ir embora.

Na sexta a noite eu e Joel fomos para o curso de salsa e bachata. Acho que já falei disso por aqui (nem lembro), não é um curso de tal e quantas semanas, é um espaço que tem curso de salsa e bachata ou cha cha cha (como se escreve?) toda sexta feira. O espaço oferece duas turmas – iniciante e médio/avançado. Ontem foi a terceira vez que fomos ao curso e estamos no iniciante.

É, eu sou brasileira com muito orgulho e muito amor, mas não sou boa com dança. Eu sei ser conduzida, se o cara dança muito eu vou bem; mas se o cara não dança eu piso no pé, me atrapalho toda e faço o cidadão querer correr para o outro lado do salão. Quando comecei a ficar com o Joel inventei de ensinar ele a dançar, e deu certo com balada sertaneja, mas agora eu preciso deixar ele me levar e às vezes é complicado lembrar disso.

Todo latino que se preze ri muito as custas dos suecos porque eles tem uma deficiência de gingado que é… quase que um traço típico. Eu não faço muita troça disso, uma vez que nunca fui “a dançarina” baladeira e to bem longe do que “a baiana tem”. Infelizmente, nem por isso foi mais fácil convencer o Joel de que não é assim tão difícil, e que não, não é feio quando ele dança: ele não quer definitivamente sair do iniciante, apesar de nós dois sabermos dos passos de cor. Sem problemas afinal, as aulas de salsa e bachata são muito legais; sem falar que a maioria dos suecos que conheço amarelam e nem passam perto de um salão, o que significa que o Joel fazer o curso já é uma conquista e tanto.

Eu nunca havia ouvido falar de bachata antes do dia em que encontramos esse curso estilo drop-in na internet. Bachata é uma dança latina oriunda da República Dominicana, tão sensual quanto simples. Mas é gostosa, parece que gruda na pele. Agora ando até mesmo selecionando bachatas no spotify só por causa do ritmo – as letras são tão cheia de dramas como só um amor latino poderia ser… – estou mesmo muito mais entusiasmada pela bachata do que pela salsa.

PS.: Eu não ia deixar nenhum vídeo de bachata aqui porque a maioria deles é com um casal super-hiper-maxi pró, o melhor casal na categoria (no mundo) atualmente. Mas a senhorite Danieli que é leitora assídua do blog me mandou o link, então como expliquei para ela resolvi deixar para todo mundo aqui uma breve descrição: o que eles fazem até o fim do primeiro minuto de dança é utilizar os passos básicos com um requebrado a mais da morena aqui e um giro mais incrementado ali… o resto da coreografia já é super avançado e eu nem imagino quantos anos de treino são necessários para chegar nesse nível. Hahahaha – sorry, eu não resisti! Por fim, essa é a bachata dominicana, no curso no qual estamos aprendemos a versão moderna que, além de outras coisas, é um pouco menos apimentada. Mais uma coisa: saiu até reportagem no  jornal dizendo que a bachata “pegou Göteborg”! Com certeza me pegou também!

Semana que vem tem mais…

Racismo na Suécia

Quarta feira é sempre dia de publicar alguma coisa para chorar as pitangas com o curso de sueco mas hoje passei mal e dormi das 13h até as 17h, perdendo a prova de argumentação. Fui até a escola e falei com a professora, estava com tanta dor de cabeça que não conseguia explicar que tinha dor de cabeça. Agora to nova de novo e por isso retomei um post que ando escrevendo há alguns dias… mas primeiro, tem mais uma blogueira morando na Suécia: a Jozy, uma mineira que veio morar numa cidade de Dalarna, lá no norte. Link ao lado, na categoria dos ‘cumpadis e cumadis’.

Hoje quando fui ler o blog da Somnia fiquei por dentro da polêmica do bolo “negro” que foi cortado e comido em Stockholm há dois dias – para ler o texto clique aqui; polêmica essa que cresceu “graças” ao facebook. A história é a seguinte: o artista africano Makode Aj Lind fez um bolo em forma de uma mulher negra e pediu a ministra da cultura sueca que cortasse o bolo; enquanto ela cortava ele gritava. Alguém tirou uma foto do ocorrido, escreveu 5 linhas sobre o fato de que todos riam ao “devorar” um bolo em forma de negra na Suécia e colocou no facebook; todo mundo que leu as 5 linhas acreditou que isso havia sido uma demonstração clara de racismo e compartilhou, e a coisa cresceu e cresceu… Felizmente tem gente com um pouco de sensatez para não se prender a 5 linhas escritas embaixo de uma foto – ou a sua imagem, que por certo é chocante – e que questiona, busca informações a respeito.

A foto da polêmica.
Fonte: Borboleta Pequenina Somniando na Suécia

Desde que eu fui para Borlänge to tentando terminar um post sobre racismo na Suécia. A questão do racismo na Suécia é delicada. Historicamente a Suécia não tem lá boas referências: havia grupos nazistas muito fortes e organizados e durante a década de noventa uma série de novos grupos que não se identificavam com o nazismo mas ainda pregavam a superioridade da raça branca – que usavam principalmente do rock para difundir seus ideias – se formaram para defender a raça nórdica. Mas segundo a Säpo e EXPO (uma organização contra o preconceito racial) esses movimentos diminuíram e quase estagnaram. De acordo com a reportagem do Göteborgs Posten de 05 de março, a maioria desses grupos de desestabilizou porque não soube, por exemplo, como trabalhar com o advento das mídias sociais – ninguém vai curtir uma página de racismo no face, não é mesmo? No facebook ninguém é racista ou homofóbico, machista ou corrupto – claro que existem algumas exceções… Em contra partida, alguns grupos estão tentando racionalinazar a discussão, se mostrando como “nacionalistas” ao invés de racistas e investindo pesado na política.

O Nationaldemokraterna é um desses partidos mais radicais, mas também há o Sverigedemokraterna – um tanto quanto mais sutil, mas nem tanto – que conquistou cadeiras no Parlamento Sueco nas últimas eleições. Durante a campanha eles tentaram mostrar e provar de todas as maneiras possíveis o quanto estrangeiros – principalmente refugiados – são um peso aos cofres públicos.

Apesar desses grupos contarem com um número pequeno de seguidores, chamam a atenção e utilizam de qualquer brecha possível para demonstrar que os suecos correm perigo na mãos dos “invasores”. Há algumas semanas um caso de um idoso que foi espancado em Kortedala por um grupo de rapazes “estrangeiros” – filhos de estrangeiros na verdade – foi o gancho para que Nationaldemokraterna organizasse uma demonstração em prol do povo sueco. A demonstração contou com a participação de 30 pessoas. Para o mesmo dia e mesma hora, 500 pessoas se mobilizaram para uma contra-demonstração: uma demonstração contra o racismo.

O povo sueco quer banir o racismo do seu país e esse esforço obtêm bons resultados. Aparentemente, apesar dos grandes problemas de integração, o preconceito entre suecos e africanos/árabes é muito maior devido a religião – a  maioria dos africanos e árabes que moram na Suécia praticam o Islã – do que por questões de raça/cor. Pessoalmente, a impressão é que há maior preconceito contra leste europeus do que contra “pessoas de cor”.

Poloneses, romenos e balcãs são tidos como fracassados fugindo de seus países falidos. Por terem passaporte europeu eles migram para os países do oeste europeu – melhor desenvolvidos na Europa – em busca de uma vida melhor, e na maioria das vezes o que encontram é uma vida muito dura. O setor da construção civil, por exemplo, está cheio de “polacos”. Já ouvi expressões do tipo “é só para isso que eles servem”.

E quem não serve “nem para isso” são os ciganos. Desde que mudei para Görteborg há duas ciganas pedindo nas portas do Nordstan: elas passam o dia inteiro ajoelhadas em posição de súplica – com o rosto voltado para o chão – esperando por moedas.  Recentemente uma delas levantou e veio direto para mim pedir esmolas. Fiquei passada: há ajuda em dinheiro do “social” sueco para todos – inclusive alguns brasileiros vivem do social por aqui – por que essas pessoas ficam pedindo esmolas? Em casa conversando com o Joel ele me contou que há muito os ciganos são tido como um povo que não tem lugar na Suécia – e nem na Europa, e que houve um tempo em que a Igreja Sueca foi responsável por castrar todos os meninos ciganos, numa tentativa maluca de conter o crescimento populacional. O principal problema com os ciganos é que eles são um povo sem país: alguns vem da Romênia, mas há ciganos da Índia, da América, de todo o lugar. Agora a Europa inteira está lutando pelos direitos desse povo sem nação, mas nem todo mundo entrou no clima: o presidente Sarcozy, da França, deportou ciganos de volta para a Romênia no ano de 2010.

A Somnia deixou um questionamento no post dela que achei bem pertinente:

Sim, porque a Suécia onde eu vivi, apesar de não ser perfeita, não combina com aquelas imagens. A Ministra da Cultura numa declaração aberta assim de racismo? Não. Mesmo uma ministra de partido moderado. Simplesmente não tem nada a ver com a maior parte das pessoas suecas que conheci e o como grande parte daquele povo luta para tentar ver todos os povos como iguais, ainda que diferentes. Ou será?

Racismo e racismos, as pessoas sempre tem seus preconceitos, mas compartilho da mesma impressão que a Somnia: o povo sueco (a maioria dele) trabalha muito a questão da igualdade, seja ela de gênero, de cor, de opção sexual, de religião, dos deficientes, seja do que for. Há problemas de integração, obviamente, mas isso é uma questão de choque cultural também.

E mais do que isso: as pessoas na internet precisam parar de se deixar levar por uma imagem seguida de 5 linhas… vamos praticar a inteligência pesquisando e nos aprofundando em algum tema antes de compartilhar. Nem tudo o que eu escrevo, por exemplo, é certo e justo!

Só 99% das coisas… =P

PS.: A respeito do trabalho do artista e da forma como escolheu tratar do tema da mutilação de mulheres na África ainda não formei opinião e penso que cada um é livre para não gostar e/ou gostar da “obra” ou da ideia do artista. Só não acho válido repassar a informação aos pedaços, como se fosse uma fatia de bolo. Não me aprofundei no tema do “bolo” porque obviamente esse foi o gancho do texto.

Um ano na Suécia!

Dia 13 de abril completei um ano de Suécia.

E… é difícil definir. Não poderia escrever que tive o ano mais maravilhoso da minha vida na Suécia; nem tampouco afirmar que foi um ano de merda. Foi um ano de adaptação e acho que esses são períodos da vida especiais – como o primeiro ano de facul, o primeiro ano de casados, o primeiro ano em uma cidade nova, o primeiro ano em um emprego, o primeiro ano como mãe ou pai, o primeiro ano sem uma pessoa querida que morreu… Períodos de adaptação sempre trazem surpresas boas e más.

É claro que não me acostumei a ficar sem “o meu povo” mas acho que internet ajuda bastante, e como eu comentei aqui depois que a minha mãe e pai tem skype me sinto muito mais amparada. A gente conversa no mínimo uma vez na semana com vídeo então eu posso ver eles e eles me veem, sem falar que por não ter custos podemos conversar mais tempo.

Dizem que o primeiro ano junto com o parceiro é o mais difícil. Descontando os meses no coletivo – mudamos para o “nosso apê” em dezembro – eu e Joel temos 5 meses de estrada, e vai bem. Claro que eu tenho os meus pits de mulherzinha e que sendo o Joel o Sr. Organização acabamos criando situações hilárias. Hilárias sim: todos hão de convir que a maioria das briguinhas entre homens e mulheres são por coisas tão pequenas que chegam a ser hilárias; basta olhar um stand up pra perceber que a maioria das piadinhas são sobre relacionamentos. Mas graças ao fato de que o Joel tem um ótimo senso de humor e que eu não posso resistir a uma piada muitas vezes quando eriçamos o pelo ao menos um de nós tem o espírito de fazer graça a respeito, quebrando a tensão e estabelecendo a paz e a prosperidade para muitos minutos mais nesse lar. Que frase linda né? Eu sempre digo que se em quase 7 meses no coletivo dividindo um quarto (para nós dois e nossos egos) e a cozinha, sala e banheiros com mais 3 pessoas vivemos bem e não separamos então não será agora que temos praticamente 20 metros quadrados para cada que vai acontecer.

O que eu mais gosto em Göteborg: cinema, o spårvagn, pubs, a academia (que é muito chique e tudo cheira como novo – brasileiro adora coisas com cheiro de novas!), o mar tão perto e a arquitetura da cidade.

O que eu não gosto em Göteborg: chove demais, chove demais e chove demais. E quando chove faz frio!

A maior furada: a distância para o Brasil. Ô que me dá um treco não poder pegar um busão e dar um oi para todo mundo!

A maior tacada: o apê de 41 metros quadrados. É super fácil de limpar e ficou absolutamente lindo mobilhado com poucos móveis. Quem precisa mais?

Coisas que eu queria ter de volta: meus vestidos – to sempre de duas calças e blusa+blusa de manga+blusa quentinha+casaco; ou seja, empacotada – e bailão sertanejo.

Coisas que eu não quero de volta: meu trabalho na prefeitura. Sim, foi ótimo, estável, me deu muita experiência e um excelente salário a cada fim de mês; mas apenas quem é assistente social sabe o quando se paga por trabalhar em uma área que todo mundo quer usar como alavanca política.

Comida que mais sinto falta: churrascooooooo! Mas na verdade quando vejo minha irmã publicar no Face “hoje é dia de lasanha” ou “hoje é dia de nhoque” – como hoje – meus vermes se agitam. Sinto a maior falta de comida de mãe!

Comida que aprendi a gostar: indiana. Nunca tinha provado e acho o maior barato, além do que é a única comida “quente” que consigo botar goela abaixo sem sufocar.

O que eu quero a partir de agora: um emprego de segunda a sexta!

Maior desafio e sonho para o próximo ano: organizar meu casório!

Se eu pesar o que ganhei e o que perdi nesse período acho que a coisa fica empatada, mas o principal objetivo com essa mudança louca foi estar ao lado do homem mais lindo, generoso e super do mundo: Joel Abrahamssom, eu amo você. To imensamente satisfeita com esse aspecto da minha vida assim posso considerar que tenho obtido sucesso nessa empreitada.

Afinal de contas, logo me tornarei a Sra. Abrahamsson…

Coma comida ecológica!

Lancei um “ridículos” no meu bicho papão da solidão e transformei ele no Chacrinha. Rachei de rir, ele morreu de vergonha e fugiu. E como “quem não se comunica se estrumbica” tratei de dar um olá para todos os meus conhecidos suecos. Vou trabalhar mais a relação com esse povo, afinal, eu já sei que eles são “difíceis”, se eu ficar só reclamando nada vai mudar.

Falando nisso encontrei a Karolina ontem no mercado e fique morrendo de remorso. Na bem da verdade, foi ela que me encontrou, me deu um super abraço e me fez dar umas boas risadas. Eu realmente posso considerar ela minha amiga, e ela é SUECA. Pra você ver que tristeza é um sentimento traiçoeiro por demais… eu me fazendo de dodói, agora preciso morder a minha língua: eu tenho uma amiga sueca gente, e fui EU que esqueci dela.

A Karolina é enfermeira e vai casar em agosto com um dos melhores amigos do Joel. A gente tava fazendo um daqueles papos furados quando ela disse que tava morrendo de vontade de chips, e eu disse que nunca tenho vontade de comer essas coisas industrializadas, só comida ecológica e o que faz bem ao coração. Claro que ela riu (comedidamente, mas riu) e entrou na brincadeira, porque precisava de umas dicas para ser mais saudável.

O inverso seria mais sensato, uma vez que ela é vegetariana. Não que eu esteja a fim de me torna vego, mas eu tenho que admitir que os vegetarianos comem melhor, ou que, no mínimo, são mais criativos na hora de fazer compras e preparar um prato. Aprendi muito depois que mudei para a Suécia (e tive de me abdicar de comer a mesma quantidade de carne que comia antes) sobre alimentação, principalmente porque todo mundo busca um cardápio mais balanceado.

Hoje vamos ter o tal debate na aula. Há, eu realmente recebi um e-mail ontem as 10 e tantas da noite com o seguinte recado: “amanhã antes da aula nos encontramos e decidimos o que vamos falar.”… vá???!!!!!! Antes da aula quando? Tipo 5 minutos antes da aula? Odeio fazer trabalho em grupo, que palhaçada isso!

Fiz uns apontamentos, pesquisei uma série de sites sobre comida orgânica/ecológica e descobri uma série de coisas interessantes. Há uma tendência de que consumidores que optam pela comida ecológica (segundo o Bláblánomequenãolembroblá Institute da Suécia – um órgão que publica estudos sobre o que os suecos compram e etc) optam por um leque muito mais variado de produtos do que os que não compram comida ecológica. Concordo com isso: antes de entrar nessa a minha dieta sempre foi feijão com arroz e carne e salada. Gosto muito de macarrão, mas sempre que fiz macarrão foram duas modalidades: macarrão alho e óleo – para os dias de preguiça – e macarrão a carbonara (molho de tomate e carne moída); muitas vezes com feijão, mas sem salada. E salada sempre foi uma salada, de preferência alface ou tomate que é rapidinho por demais.

Sim, meu lema na cozinha sempre foi “por que complicar se não precisa”? Sou preguiçosa e feliz na hora de cozinhar também, e no meu caso isso pode ter mudado não porque comecei a comer comida ecológica mas porquê conheci o Joel; ele adora preparar um prato caprichado. Depois que eu introduzi o molho de tomate para o macarrão aqui em casa ele até decidiu fazer molho de tomate caseiro – sim, ele passou horas cozinhando tomates e testando esse e aquele tempero. Parece coisa de filme porque ele vai para a cozinha e solta um jazz; parece um chef cortando coisas e misturando e… eu olhando claro, pra aprender. =P

Mas sobre a comida ecológica: não há nenhum estudo científico que comprove que a comida orgânica/ecológica é melhor para a saúde do que a comida convencional. Entretanto uma pesquisa feita nos EUA em 2002 aponta que os primeiros apresentaram em média 13% de resíduos de substâncias químicas nas amostras enquanto os alimentos convencionais apresentaram em média 71%. Não precisa ser gênio para saber – e eu não concordo que seja senso comum acreditar – que resíduos de pesticidas e herbicidas prejudicam a saúde. Além disso, eu sou caipira bem, vi com esses olhos que um dia a terra há de comer… hahahaha. Brincadeira. Como eu morei no interior eu sei de muitas pessoas que se intoxicavam com “veneno de lavoura”. Se o alimento convencional não faz mal para quem come ainda faz muito mal para quem o produz.

A Universidade de Uppsala fez um estudo apontando que o problema dos orgânicos/ecológicos é que a produção desse tipo de produto não pode atingir uma grande escala. As perdas nas lavouras de orgânicos sempre são mais acentuadas do que nas convencionais que por utilizarem todo o leque disponível de “idas” (pesticidas, herbicidas, inseticidas…) e sementes transgênicas produzem mais. Segundo esse apontamento, se a humanidade escolher a produção orgânica condenará a fome milhões… Eita discursinho capitalista viu? Segunda a FAO jogamos fora cerca de 1/3 de tudo o que produzimos, seja por causa de transporte e armazenamento inadequado ou porque os alimentos que perdem a aparência viçosa perdem também seu valor comercial.

É fato que os alimentos orgânicos/ecológicos tem uma vida mais longa do que os alimentos convencionais – principalmente no caso dos hortifruti – uma vez que os convencionais tem mais água e por isso parecem murchar e adquirem a aparência de “velhos” muito mais rapidamente do que os orgânicos/ecológicos.  Consumidores habituados a comprar orgânicos compram alimentos mais maduros porque sabem que eles não vão estar podres no dia seguinte. Ainda segundo a FAO, na Europa até 115kg de comida são jogados fora por ano (per capita) contra 11kg na África. Na América Latina as perdas no processo de transporte/armazenamento chegam a 40% da safra anual. Acho que podemos muito bem passar sem transgênicos e os “idas” se aprendermos a utilizar, transportar e armazenar melhor os alimentos.

Foi por isso que o programa Fome Zero ficou tão famoso no mundo. Tem muita gente que acredita que Fome Zero era só um nome bonito para o Bolsa Família, e que fora disso muito pouco se fez. Ledo engano e falta de informação, para variar. O Fome Zero tem uma série de parceiros – entre eles o “Alimente-se bem com um Real” do Sebrae (não to certa que era do Sebrae mesmo, mas é um dos Ss) e os programas de apoio a Agricultura Familiar. É muito mais fácil para um pequeno produtor rural ser um produtor orgânico do que convencional: ele não precisa botar a cabeça a prêmio no banco anualmente para financiar a compra dos grãos e “idas”, além do que o objetivo da cultura orgânica é a qualidade e não apenas quantidade. Por isso mesmo em 2009 82% dos agricultores paranaenses que cultivavam orgânicos/ecológicos eram agricultores familiares.

Essas e outras coisas encontrei garimpando sites (em português ainda, claro) na internet sobre o mercado de produtos orgânicos no mundo – que cresce cerca de 8% ao ano. Escrevi um monte de tópicozinhos em sueco e daqui a pouco vamos ver se eu consigo falar na frente de todo o mundo sem gaguejar.

Pelo menos aqui no blog consegui convencer alguém?

Haha…

Porquê não mudar para a Suécia

Final de semana estive conversando com novos amigos brasileiros. Pra minha felicidade a Mari (do blog Mundo da Mari) veio conhecer Göteborg com o marido e mais uma família muito supimpa. O resultado foi para lá de positivo: demos um pulinho no castelinho de Haga e como estava chovendo – essa foi a desculpa – e nevando nos escondemos em um pub e demos altas gargalhadas. Sim, exatamente aquele tipo de gargalhada que atrai o olhar de todos os suecos sentados ao redor – rir alto não é lagom.

Conversa vai e vem, comentamos um pouquinho sobre a fantasia que muita gente tem que quem muda para a Europa muda para um reino de conto de fadas. Eu acho que mudamos mais para um tipo de Duloc – lembra do Shrek? Aquela musiquinha: “aqui em Duloc é tão bom viver, nossas regras já vamos lhes dizer: no jardim não pisar, todos cumprimentar, Duloc é especial. Na cabeça shampoo, lave bem o seu… pé! Duloc é, Duloc é, Duloc é especial!”

Funciona exatamente igual quando mudamos para um país perfeito. Esses países europeus onde a democracia impera, o machismo já morreu e todo mundo sabe na ponta da língua os seus direitos. Onde os políticos corruptos são presos. Mas também onde não é legal rir alto, dançar solto e nem chorar demais – isso é sinônimo de selvageria. Não é lagom. E é claro que você também vai querer fazer o que é lagom, todo mundo sabe o seu lugar na sociedade, todo mundo sabe que tem que contribuir. Um reino quase perfeito. Quase. Mas não porque o dono de Duloc ainda não é rei, e sim porque falta muita coisa que é comum aos nossos olhos.

Depois que passei esse dia especial com eles, fiquei quase deprimida. A última vez que ri tanto foi quando estive no Brasil. Me dá uma sensação de vazio enorme. Uma solidão. E eu nem posso pegar um ônibus e dar uma chegada na casa da Angela, tomar uma breja na varanda da casa e falar do infinito. Nem tomar um teres com a Lu enquanto a gente comenta as travessuras da Alana. Ou fazer um papo furado com a Maira por causa da falta de homem bonito e solteiro no mercado. Viver aquela montanha russa louca com os cabo de guerra familiares, que bem ou não resolvidos são esquecidos no minuto seguinte a base de um bom churrasco…

Aqui eu tenho internet melhor, transporte melhor, acesso melhor a cultura entretenimento e etc e tal. To conectada, como diriam muitos, com o melhor que a tecnologia tem para oferecer. Plugada no mundo e… sozinha. Conexões humanas zero. Eu e Joel contra o mundo. Que saco isso. Não tenho amigos suecos, todo mundo tem agendas cheias de compromissos consigo mesmos. Tenho “uns par” de colegas de trabalho, pessoal com quem é legal pacas confraternizar uns minutinhos, mas se for para botar as fofocas em dia ou chorar algum leite derramado, ainda ligo para o Brasil.

Talvez seja cedo para reclamar, talvez seja eu que não dou cola e bola para minhas relações suecas. Mas elas estão pobres, pobrérrimas (se essa palavra existe): fora Joel e família, não teria ninguém com quem eu posso contar. Volta e meia rola um dia desses no qual eu falaria para alguém mudando: fique lá, pense mais um pouco. Aqui chove demais (ainda mais quando a gente tá cansado e chateado), neva na primavera e o verão faz 15 graus C… E o pior: vai demorar mais de um ano para você ter amigos, se você não misturar com brasileiros e formar uma panelinha feliz.

Tem dias que a Suécia parece mais um sonho estranho, daqueles que a gente nunca sabe ao certo se foi bom ou ruim, um sonho que foi só… esquisito. Só um exemplo: tivemos quase 15 graus quando a primavera começou, agora desde sexta está frio, hoje chove (de novo) e neva e tinha um cervo no jardim da casa da avó do Joel. Ele parecia o Bambi com a bunda e o rabinho branco. Tudo louco e fora do compasso.

Eu posso estar e estou maximizando sentimentos aqui, nesse post. Mas isso é só para deixar bem claro que nas plaquinhas da Duloc sueca o “hahaha” é sempre escrito com letras minúsculas, e tem de ser comedido. Quem já leu ou está lendo sobre choque cultural vai dizer: ahhhh… É isso também. Choque cultural não é uma coisa que dura 3 meses. Eu ainda to dentro: tem dias para se maravilhar, e tem certos dias que dá uma vontade de chutar o lagom para Marte e mandar todo mundo a pqp, bando de gente sem sal e sem salsa. Depois eu me acalmo e acho que posso sobreviver.

Claro que posso.

Pequenas Grandes Coisas da Minha Vida Sueca #13

To escrevendo esse post desde a semana passada porque graças a Deus eu arranjei mais algumas horas trabalhando como assistente pessoal. Um experiência nova, empolgante e exigente, uma vez que vou trabalhar com uma pessoa autista. Bom, bom,bom; já li alguma coisa sobre isso mas nunca havia tido contado direto com algum autista.

E não foi só isso: na sexta feira fiz uma entrevista de emprego e paguei o maior mico. Tenho uma amiga sueca que é enfermeira, e um dia conversando e tals falávamos de trabalho quando eu disse que queria um extra para guardar dindim para o casório e ela comentou que estavam precisando substitutos para o trabalho dela. Ela me passou o telefone da encarregada e disse que era muito legal passar o dia com os moradores da casa e etc, e que era meio parecido com assistência pessoal. Eu entendi que era um lar de idosos, porque existem muitos lares de idosos aqui na Suécia que contam com assistentes fins de semana ou mesmo diariamente. No fim da entrevista descobri que o lar é para pessoas com deficiência mental… sorte minha que o pessoal do lar gostou bastante de mim. Eu me desculpei claro, mas devo ter podido estrelar “Morango do Nordeste” por alguns bons minutos.

Esse último não tem nada a ver com o trabalho com a pessoa autista. Falando nisso, estive hoje com um grupo de autistas por uma hora e pude vislumbrar por alguns instantes como esse universo é enorme: um autista pulava entusiasticamente no meio da sala enquanto outro estava totalmente concentrado com as formas de um objeto. Obviamente, muitos autistas conseguem ter uma vida sem assistência, mas eu tive a oportunidade de visualizar os casos mais complexos em que a pessoa precisa constantemente de uma âncora para ter um pé nessa vida que nós chamamos de normal.

Como diz o ditado, vivendo e aprendendo. Como esse blog não vive só de dizeres populares, um pouco da novela aprenda sueco na Suécia:

Eu falo e repito que odeio fazer trabalho em grupo. Primeiro, porque eu não fiz nenhum amigo na turma do SFI, e também não fiz nenhum amigo na turma do SAS. Na turma do SFI eu fiquei na minha depois que uma tailandesa disse bem na minha cara: “Eu tenho raiva toda vez que ouço você falar, porque eu moro aqui há quatro anos e não consegui terminar o SFI.”. Eu tentei dar uma resposta, mas ela só virou as costas e saiu. É a vida…

Na turma do SAS tem a Margareta, uma peruana que sempre conversa comigo. Mas ela tem uma criança e muitas vezes não vem para a aula porque a criança está doente. Às vezes ela chega atrasada e como não há lugares marcados na classe a gente não senta juntas. Foi o que aconteceu na última quarta-feira: quando ela chegou estávamos justamente separando grupos de trabalho para um debate, e uma chinesa já havia me chamado para fazer parte do grupo dela. Eu acho muito legal essa coisa de sentar com pessoas novas e conversar, mas trabalhar em grupo para mim é bastante difícil. Não sou flexível, não tenho paciência e… não tenho paciência.

Vamos simular um debate na próxima quarta e meu grupo escolheu o tema: “Coma comida orgânica/ecológica”. Sou parte do time a  favor da comida orgânica/ecológica, e o objetivo é apresentar argumentos suficientes para a causa. Entrei na internet depois da aula de quarta, pesquisei sobre o tema, escrevi algumas coisas e mandei para o pessoal do grupo. To no vácuo até agora. Isso me desgasta. Eu fico pensando que todo mundo tem seus compromissos e tals, mas não ajuda. Quarta feira vamos ter de falar na frente de todo mundo, estar seguros e preparados para isto; não rola olhar 5 minutos antes da aula o que é que dá para fazer… talvez seja só eu que precise me preparar para. Odeio fazer trabalho em grupo.

Esse relato escrevi no sábado. Fim de semana continuei no vácuo e quem quebrou o ‘silêncio’ da minha caixa de e-mails foi a professora avisando que não teria aula hoje; que booooommmmm. Em seguida uma das pessoas do meu grupo escreveu algumas linhas dizendo que ela não tinha encontrado nada “ainda” para contribuir com a construção dos argumentos. Ao menos alguém respondeu e agora temos uma semana de novo pela frente, quem sabe o que vou encontrar na minha caixa de e-mail na terça feira a noite?

Fico incomodada quando uso a expressão vida normal, por isso… não uma ou duas vezes me pego filosofando sobre o que seria uma vida normal. Trabalhar de segunda a sexta, começando as 8h e saindo as 17h; ter férias uma vez ao ano; viajar; completar a graduação, pós e mestrado; passar Páscoa e Natal em família; bla bla bla… Se for assim nada na minha vida se parece com uma vida normal; por aqui tudo muda todo o tempo.

Falando nisso, adjö blog en gång till… acabei de receber visitas!