O Arbetsförmedlingen e eu

Eu tenho sérios problemas com a agência de empregos sueca.

E não, não sou só eu: somos eu e todos os estrangeiros, somado a todos os suecos desempregados. Atualmente, cerca de 445 mil pessoas (ou 8,7% da população sueca) entre 15 e 74 anos está desempregada, segundo dados do SCB. Segundo “O Globo”, no Brasil a taxa está em 5,8% da população economicamente ativa.

Obviamente, no Brasil de quase 200 milhões de habitantes 5,8% significa que muito mais pessoas estão desempregadas do que os 445mil na Suécia. Mesmo assim, estamos num país de primeiro mundo que tem uma agência de empregos de merda. Se a agência de empregos sueca funcionasse como as demais instituições suecas… o desemprego aqui seria perto de zero. Mas taí o problema né, porque o A não funciona.

Eu to inscrita na agência desde que recebi meu personnummer, em algum dia do passado longíquo de abril de 2011. Desde o primeiro dia que me cadastrei o meu objetivo foi um emprego como assistente social; mesmo quando eu não falava mais do que oi e tchau em sueco, eu expliquei para eles que queria ser assistente social na Suécia. Eles me apresentaram uma série de programas e incentivos que nunca foram usados – comigo – e eu saí de lá achando que teria uma parceria. Que não existe.

É importante deixar um parêntese, apenas para clarear as coisas: eu sou desorganizada sim, em muitos aspectos, e ver uma pilha de roupa para passar ou para guardar me enche de preguiça, mas eu não tô sentada esperando que o A resolva a minha vida para mim não, eu corro atrás do que eu quero: eu trabalho mesmo que não seja o trabalho que eu sonhei. Enquanto estou lá melhoro meu sueco e o mais importante de tudo, adiciono contatos porque aqui na Suécia é super importante ter um QI (quem indica) alto e variado.

Se você quer parceria com o Arbestförmedlingen tem que sentar na porta deles: ligar lá, mandar e-mail ou encher o saco do seu handläggare diariamente. E nisso, há, nisso infelizmente eu sou uma porta. Quer fazer algo por mim?, ótimo, faça. Não quer fazer?, no problems, eu não me importo; sou maior de 18 e consigo me virar muito bem, obrigada. Agora… sério mesmo, se o seu trabalho seria me ajudar… como dizem os suecos: hallllååå? É realmente necessário que eu te lembre disso todos os dias?

Minha primeira handläggare eu vi uma vez e… nunca mais. Nem por telefone, nem por e-mail. Eu sempre recebia uma daquelas mensagens automáticas: fulana não está no escritório hoje, ela volta tal horas. Ela está de férias, volta em agosto. Ela está doente, talvez nunca mais volte. Meus e-mails ficaram no vácuo eterno. Aí trocaram meu contato lá dentro e… ela me tratava como uma débil mental, fa-lan-do co-mi-go pau-sa-da-men-te e (pausa para respirar) sem-pre per-gun-tan-do se eu es-ta-va en-ten-den-do a-pós ca-da sen-ten-ça – hänger du med, eller? Eu nunca entendi. Falar com ela era um tormento pois se eu fizesse qualquer pergunta ela começava uma explicação do tipo: no príncipio, Deus criou o céu e a terra, e viu que era bom. E falando comigo pausadamente. E perguntando se eu estava entendendo, ela explicava toda a história da criação sem nunca responder as minhas perguntas. Adivinha se eu tinha saco para perguntar mais uma vez?

Sem contar que tudo ela precisava perguntar a outra pessoa, porque ela não tinha a informação. Em janeiro decidi deixar meu emprego de 40% – aquele com o Zé, duas vezes na semana – e ficar só com meu viakariat – substituta, pra trabalhar quando há vagas. Informei isso a handläggare e ela começou a discutir comigo as minhas razões. Cara, me deu nos nervos. Me perguntou duzentas vezes porque eu não queria continuar como assistente pessoal. E o fato de eu ter um diploma de assistente social? Esqueça. Para ela, eu tinha um emprego como assistente pessoal e devia ficar feliz.

Gente, eu fui muito feliz no meu emprego de assistente pessoal. Sério. Eu ainda trabalho com isso e mesmo que existam aqueles momentos de limpar a bunda do cliente (é isso mesmo!), é um trabalho legal. Eu sempre pergunto para o pessoal que está mudando para cá e entra em contato comigo para chorar as pitangas porque é difícil arrumar emprego: você gosta de trabalhar com pessoas? Tem saco e estômago para virar quase alguém da família de outro alguém e seguir um monte de regrinhas (que a primeira vista, parecem bem bestas)? Procure um emprego como assistente pessoal (personlig assistent). Ainda mais agora, durante o verão, chovem vagas. Se você não sabe o que é, assista o filme Intouchables (em português, Os intocáveis – trailer aqui). E é sempre bom deixar claro que eu to falando isso para quem mora na Suécia e tem visto, e não para quem está procurando uma forma de mudar para cá.

A questão é que é muito difícil conseguir um emprego de 40h semanais como assistente pessoal. Você pode ter até 80% (32h por semana, mais ou menos) se você tiver sorte, mas é mais provável que você consiga 20h por semana. Nada mal para quem estuda não é? Mas eu já acabei o meu tempo de estudante. Eu até trabalhei com duas pessoas ao mesmo tempo – com o Zé e o Zezinho – com um deles eu tinha 17h por semana e o outro eu tinha cerca de 15h; sendo que eu ainda aparecia todas as vezes que me chamavam extra. Mas sério… funciona por um tempo. Como assistente pessoal você terá que abrir mão das suas noites e dos finais de semana, e como eu afirmo sempre, é ótimo: você consegue contatos (QI) suecos e melhora o sueco, mas não vai funcionar para sempre.

Depois de muito discutir com minha handläggare número 2 ela passou a bola para outra pessoa. Pá, a primeira conversa com a handläggare número 3 me deixou nas nuvens: ela respondeu, não me tratou como uma criança de 4 anos e pasmem, respondeu a todas as minhas perguntas. Me disse que a gente faria um plano para mim conseguir o meu sonhado emprego. Gente, eu fui às nuvens!

Fiquei esperando o contato dela que nunca chegou. Pra piorar, mandei um e-mail para ela com o endereço errado (mea culpa) e ela nunca recebeu. Depois de duas semanas recebo umas cartas atrasadas do A e numa delas havia um horário para entrevista, aquele tal em que a gente faria o plano para alcançar o emprego dos meus sonhos. Liguei e ela não respondeu e lá fui mandar o e-mail… e fui aí que percebi que eu havia escrito o nome dela errado e que ela nunca havia recebido minha mensagem com as informações do meu endereço novo entre outras coisas.

Pedi desculpas e tals e; ela nunca responde e-mails. E nunca está no escritório. É como a handläggare número um. E me manda cartas. Eu não entendo, de verdade, o que ela tem na cabeça. Um e-mail não custa nada e é enviado no mesmo instante. Uma carta custa o papel, a impressão, o envelope e o selo e demora um dia para chegar as minha mãos, no mínimo! É super romântico enviar cartas, eu acho, mas eu não to afim de uma relação íntima com o A. Eu quero algo mais efetivo, e talvez, só talvez, eu tenho uma vaga ideia de que e-mails são mais efetivos, mais baratos e ainda por cima, ajudam a preservar o meio ambiente!

Recebi um pacotão dela pelo correio há, o que, um mês atrás: ela imprimiu todas as vagas disponíveis para o cargo de assistente social na região (sim, todas aquelas que estão no Platsbanken, que por acaso, eu sei acessar) e me enviou. Por correio. Umas 40 páginas. É gente, tem muita vaga para assistente social aberta. Todas aquelas vagas que ela imprimiu e me mandou eu vi. Todas elas eu acessei. E todas que não exigem mais do que Socionomexamen eu já havia buscado, antes mesmo de ela me mandar os impressos. Mas foi legal da parte dela me enviar. Só não foi legal para o meio ambiente, pois no momento em que eu entendi que ela só havia impresso direto da página do A, todas as 40 e poucas folhas foram para o lixo.

Entrei em contato, expliquei que eu me viro bem com internet, que foi super atencioso da parte dela, mas desnecessário, mandar os impressos. Ela não respondeu. Enviei mais dois e-mails e no último, você recebe meus e-mails? E ela: sim, eu entro em contato. Adivinha como?

Recebi mais uma chamada para entrevista, por carta, mais uma que chegou o dia depois que eu deveria ter comparecido a entrevista. Aí recebi essa semana uma cartinha dizendo que se eu não compareço a entrevista, o A não pode me ajudar a procurar emprego. Sério mesmo? Se eu receber a cartinha no meu e-mail, ao invés do correio, antes da data da entrevista, quem sabe eu possa comparecer a ela. Agora eu tenho que mandar um relatório mensal contando cada emprego eu procurei, de que forma, se eu liguei para os empregadores e questionei o sistema de seleção, blá blá blá.

E tem mais: sabem por quê eu sentei aqui e vomitei mais de 1500 palavrinhas? Porque hoje pela manhã me liga um tal de Sr. Empregador dizendo que tinha uma empresa de assistência e que queria marcar uma entrevista comigo porque o A tinha me recomendado. Empresa de assistência? Uipiiiiiiiiii!!! E o A me recomendou!!! Inacreditável!!! Depois de tanta palhaçada não é que de vez em quando eles dão uma dentro??? Fique tão eufórica que esqueci de perguntar o nome. E o cara me dizendo que o número de brukare‘s deles tinham aumentado (brukare=pessoa com deficiência na linguagem das empresas de assistência pessoal) e eu entendi como missbrukare (pessoa com dependência química). Eu já estava preparando o meu discurso do “eu não tenho experiência com dependetes químicos mas eu aprendo rápido” quando eu finalmente entendi que ele não queria uma assistente social, que o que ele quer é uma assistente pessoal.

Murchei. Tipo, murchei muito. Eu tenho um emprego como assistente pessoal, eu não preciso de mais um. Eu tenho dois empregos como vikarie, eu não preciso de mais um. Eu quero ajuda para conseguir uma vaga como socialsekreterare, e não como personlig assistent. Eu tenho um Socionomexamen, será que é tão difícil entender?

E porque eu não mando o A as favas? Porque antes de eu completar três anos na Suécia eles podem pagar até 80% do meu salário, se eu conseguir alguém que queira me dar um emprego – integral ou não – isso pode ser atrativo e quem sabe até decisivo. Mas para ter acesso a essa “facilidade” eu preciso estar inscrita lá, mantendo um relacionamento bem bonito com minha handläggare por meio de cartas. Sério. Acho que vou mandar meus relatórios pelo correio. Mas vou imprimir nos dois lados do papel, assim ajuda um pouquinho na preservação do meio ambiente.

Se o Arbetsförmedlingen não fosse uma instituição de merda, o desemprego na Suécia seria zero.

8 comentários sobre “O Arbetsförmedlingen e eu

  1. Oi Maria, estava com saudades do se blog!
    Estava lendo sua saga com o “A”, e nao entendi essa parte deles pagarem 80% do seu salário, poderia explicar melhor?
    Uma coisa que eu notei sobre a Suécia, é que eles nunca te passam o processo como um todo, eles só informam um passo de cada vez, e às vezes, acho que quase sempre, acabam por dificultar a “insercao” do imigrante, você concorda?
    Beijos.
    Ah, eu vou te passar um email contando da minha novela desde que eu cheguei aqui :)

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  2. Eu acho que você deveria traduzir este texto e enviar para o DN ou o GP ou qualquer outro jornal grande aqui na Suécia. Publica no Facebook a versão em sueco e vamos começar a compartilhar. Não é possível que tenha gente lá dentro tratando imigrante como retardado, que tenha gente preguiçosa empregada como handläggare e que estejam gastando uma fortuna do nosso dinheiro público imprimindo papel inútil. Você não é um caso isolado e não pode passar em branco. Isso não é aceitável mesmo! Os outros imigrantes têm que saber a roubada em que estão se metendo e os suecos têm que saber que tem um buraco negro no sistema sueco, e esse buraco se chama Arbetsförmedlingen.

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  3. Oi Maria! Em breve vou ter que começar a lidar com o A mas por enquanto não tenho experiência com eles. Não vou mentir, este texto me deixou assustada. Sua handläggare imprimiu mesmo as vagas que existem na INTERNET e enviou pra você? Ela está recebendo salário ao fim do mês para fazer isso?? Estou quase com a Maira, peça a seu viking ajuda para traduzir o texto e envie para algum jornal, eles podem nem levar a sério mas tb pode ser que a situação chame a atenção de alguém.
    Beijos!

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  4. Pelo visto não é só o Migrationsverket que trabalha de forma lenta, o Arbetsförmedlingen também!? =(
    Achei muito interessante a ideia da Maira!
    Faz isso Maria! Pode ajudar muito você e outras pessoas também!
    Beijos e Boa sorte no seu caminho!

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  5. Oi Carioca,
    Demorei uma cara, mas eu e minha desorganização. Essa coisa do A e dos 80% chama Nytt Start Jobb e é oferecido aos emigrantes ou pessoas desempregadas a mais de um ano (eu acho, não lembro todos os detalhes). Você tem que estar inscrita há 3 meses no A (quem me contou desse detalhe foi a Rubia) antes de se candidatar a ajuda. Aí você arruma uma possível vaga de emprego e corre para o seu handläggare que, em tese, deve te ajudar. Eu perdi uma oportunidade de um emprego de 100% lá no começo (como faxineira, mas era um trabalho) porque não sabia que você NÃO pode começar a trabalhar antes de fechar todo o processo com o A. Tipo, os 80% que eles ajudam a pagar do seu salário é para ser um empurrão para que o empregador se decida por você. Mas se você já tem o trampo não ganha nada. O f*** é que o A não espalha muito isso porque houve problemas com algumas empresas (inclusive o Le Pain Francés) que contratava apenas estrangeiros. Algumas até fizeram um negócio sujo como, por exemplo, ter quatro ou cinco empregados por meio do Nytt Start Jobb em um pequeno empreendimento, e cada um deles trabalhava só um dia por semana. Aí no fim o patrão ficava com uma porcentagem daquilo que o A pagava… Bom, já mudei todo o foco do assunto. Entre em contato com sua handläggare e pergunte sobre o programa, eles vão poder te explicar melhor a coisa toda.

    ****
    Oi Maíra,
    Gostei muito da sua ideia e estou tentando acertar os pontos com minha handläggare no A primeiro. Já falei para ela que acho esquisita essa nossa comunicação por cartas. Vamos ver no que dá – ainda estou no vácuo, ela me ligou um dia em que eu estava dormindo pós trabalho noturno. Hoje estou enviando meu relatório mensal. Por e-mail, porque eu tenho preguiça de ir até a caixa de correio por causa dela. Sorte do meio ambiente.

    ****
    Oi Joana,
    Também me senti muito frustrada, tipo… ela acredita realmente que em pleno século XXI a gente não consegue ler anúncios na internet? Sei lá se ela teria coragem de fazer isso com um sueco… por isso estou considerando a ideia da Maíra. No mais, arme-se de paciência guria, porque lidar com eles é um saco.

    *****
    Paulo,
    Eu não acredito que se fizesse alguma coisa do tipo sairia ilesa, mas acho que talvez possa valer a pena. Estou avaliando. Vamos ver o que ela (handläggare) me responde agora que vou enviar o meu relatório mensal. Sinto-me no jardim de infância mas… quem sabe antes de tomar atitudes mais drásticas eu mude de agência e fale com o chefão do A de onde estou registrada. Talvez, só talvez… Oremos, como diria a Joana.

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    Rafa,
    Não quero te desanimar não, mas o M trabalhar muito bem se comparado ao A. Vou tentar resolver com eles primeiro… se não der certo, seria uma boa ideia.

    Beijos!

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  6. Oi Maria, obrigada por responder, como sempre! Eu fui hoje na minha primeira entrevista no A, e munida de todas as informações, inclusive essa que vc me passou, mas antes que eu perguntasse, ele me informou dessa opção, mas me disse que sou eu quem tem que arrumar um empregador … enfim, a entrevista não me ajudou tanto, mas pelo menos eu acho que vou conseguir a tradução e validação dos meus diplomas, assim espero.
    Beijos
    P.S.: Eu te passéi um email há uns 20 dias, mas acho que vc não recebeu :(

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