Diário Caipira-99

A semana que vem pegarei licença maternidade. De novo. Não há um bebê a caminho… temos dias guardado da licença ainda por tirar. Vou aproveitar o fim do verão com os pequenos.

Acho que essa é com certeza uma das coisas mais gostosas de se morar nesse país: essa licença gigante que proporciona tanto aos homens quanto às mulheres a possibilidade de cuidar dos filhos durante a primeira infância.

Isso significa que essa semana tem sido puxada no trabalho. Como eu vou ficar fora por um tempinho tive que organizar muita coisa. Estou muito cansada, tanto por conta do trabalho em si como porquê tem havido desavenças no grupo de trabalho. Como eu peguei o bonde andando (voltei para o escritório de assistência social por causa da pandemia) não sei quando o conflito começou. Mas estava borbulhando quando cheguei e nessas duas últimas semanas explodiu.

Estou muito aliviada por saber que quando voltar da licença volto a minha antiga função. Sou muito boba em relação a essas coisas… Me deixo “contaminar”.

É uma pena porque gostei do meu grupo de trabalho. Mas eu estava fora da briga. Facilitou a minha vida mas… nem por isso saio ilesa. Torço para que consigam se entender e voltar a trabalhar em equipe superando as desavenças.

Diário Caipira-98

As pessoas às vezes dizem que querem viver até além dos cem anos. Hoje eu estava descendo os lances de escada do refeitório para o quinto andar e meu joelho travou. Eu tive que parar, esperar, alongar e esperar destravar.

Viver além dos cem anos? Acho que apenas se a humanidade aprender a voar até lá.

Diário Caipira-97

Domingo gostoso, de chuva dessa vez. A gente estava com aquela preguiça típica de dias chuvosos. Os meninos ganharam livros novos ontem e estavam super entretidos “lendo”.

Adoro as livrarias daqui. Adoro o fato de a Suécia ser um país onde se incentiva o hábito da leitura desde sempre. Acho imensamente triste que não seja simples adquirir livros em português para os meninos. Posso comprar por meio da Amazon e ler no aplicativo do Kindle mas isso tira a naturalidade da coisa de ter livros físicos, que estão espalhados por toda a casa nas estantes e bem ao alcance da mão…

Agora com a pandemia então, nem se eu quisesse pagar fretes exorbitantes. Já contei com a ajuda de muita gente querida que me emprestou um lugarzinho na mala e me trouxe livros infantis do Brasil. Infelizmente essa porta também se fechou… Uma pena, realmente. Mas vamos levando como dá.

E, apenas pra constar: há coisas mais importantes com o que se lamentar. Só queria partilhar mesmo essa sensação.

Diário Caipira-96

Diálogo real que tive hoje com uma guria 11 anos mais nova que eu:

– Nossa! Seu cabelo está lindo!! Você mesmo que fez? (Perguntei pensando nos cachos que estavam bem perfeitos naquele estilo babyliss)

– Não, foi uma amiga que ajudou a descolorir para fazer as luzes novamente e esconder a raiz que já estava crescida. Depois passamos um tonalizante para o cabelo não ficar amarelado. Arrumei o penteado e fixei com um mousse profissional que ela me emprestou e por último passamos um spray que dá uma coloração de que a raiz do cabelo já está aparecendo a cor natural… Mas esse último sai quando eu lavar, claro.

Tive que fazer muita força pra o queixo não cair. Sem falar que não entendi nada: um baita trabalho pra esconder a cor natural do cabelo e no final passar um spray que imita o tom da cor natural do cabelo pra fazer as vezes da raiz crescida?

Não estou por fora. Estou há anos luz de distância no que se refere a galáxia dos paranauês que as gurias fazem no cabelo atualmente.

Diário Caipira-95

Acordei disposta a fazer faxina hoje.

Estou curada.

PS. Faxina normalmente me ajuda a me sentir bem. Não é legal, não é gostoso, mas a sensação simples de que a gente pode dar um jeito e fazer as coisas ficarem lindas me ajuda a sentir esperança no futuro.

Freud explica.

Diário Caipira-95

Ontem abri o app do WordPress pra escrever e perdi a vontade de escrever. Tô entrando no período pré menstrual e meus ciclos nos últimos dois anos tem sido uma caixinha de surpresas.

Primeiro que dizem que “se você sofre com cólicas isso acaba com a chegada dos filhos”. É, só que não. Vai ver que isso valia no tempo que mulher mal conseguia parir uma criança e passar o puerpério em paz pois lá estava o marido esperando seus direitos pra que daí, depois do primeiro tchu tcha tcha, a dona estivesse grávida outra vez.

O meu maior problema tem sido a variação de humor. Não é que fique brava, irritada. Ficou uma manteiga derretida. Choro, choro, choro pra tudo: se algo é bonito eu choro; se é indefinido, eu choro; tocante, choro; triste, entro em depressão nível fundo do oceano Pacífico.

Fico na esperança de que (já) seja a menopausa. Seria maravilhoso!!!

Diário Caipira-95

O telefone toca as dez. No visor o nome de um dos postos de saúde do bairro. Atendo e ouço um: “Bom dia, eu sou o João, médico do posto de saúde. Você fez o teste pra saber se tem corona e o resulta é negativo. Tenha um bom dia.”

E desligou. Eu digo “obrigada” para o tu-tu-tu-tu.

Então, não sei o que sinto. Não quero ter corona, não quero ficar doente. Ao mesmo tempo queria ter essa bosta de uma vez. Eu sei que está por aí, por todos os lados; e eu queria parar de sentir todos os germes de todas as coisas que eu toco e ficar fazendo malabarismos mil pra abrir portas ou não tocar em meu rosto. To cansada desse receio quando beijo meus filhos ou quero lhes bagunçar os cabelos.

E deveras egoísta. Eu sei. Mas o que será de nós se isso nunca passar?

Diário Caipira-94

Passei o dia esperando… o resultado do teste. Que não veio. Fiz crochê pra relaxar, pensar em outras coisas.

E torta de framboesas. Afinal, nada como uma gordice pra deixar a alma leve, leve. E ficou boa a torta! Nem deu tempo de tirar foto…

Diário Caipira-92

Dei uma volta pelo jardim e constatei que:

– plantei as flores do campo nu lugar errado. A framboesa “fechou” e cresceu, faz sombra sobre meu canteiro de flores do campo. Elas gostam de sol e… não florescem.

– lesmas suecas gostam muito de batata. Deixam apenas o talinho da planta.

– o amor perfeito morreu depois de ser atacado pelos veados pela centésima vez.

– o que sobrou do amor perfeito foi atacado por pulgões.

– as flores da varanda (dois gerânios e algo que não sei o nome) são os únicos sobreviventes.

Logo: cultive plantas dentro de casa.

Diário Caipira-91

É incrível como a gente é feliz com coisas simples. Fui ao bosque que fica do lado de casa e colhi uns mirtilos. Depois pegamos framboesa no jardim – herança da avó do meu marido. Um copo de mirtilos, umas framboesas, banana e leite; voilá, estejam servidos de uma deliciosa batida (ou se for glamourizar, smoothie).

O dia de sol, a gata correndo atrás de borboletas e as crianças fazendo bolhas de sabão (ou se dizem bolas?) poderia ser a cena de um filme. Eu quero guardar essas cenas de luz.

Apenas.

Diário Caipira-90

Eu não sou feita pra essa coisa de isolamento. Estou o dia inteiro pensando positivamente, na saúde das crianças e do marido. Mas – sempre o mas – não sei viver sem abraçar e acarinhar minhas crias.

Agora mesmo destravou-se uma guerra porque o pequeno queria dormir comigo. Em épocas normais não haveria qualquer impedimento. Agora, enquanto espero o teste, não quero dormir no mesmo quarto com as crianças.

Essas incertezas tiram muito da gente.