Pensei que conseguiria escrever o post já no início da semana mas nem. Todo mundo que tem blog e que não bloga todos os dias gostaria de fazer isso e eu não sou exceção. Escrevi um pouquinho por pouquinho e foi bom porque assim pude organizar um pouco melhor as ideias.
Eu queria conhecer Fátima há muito tempo, acho que desde que a Gisele mudou-se para Algarve eu pensava em visitar a ela e de quebra dar uma esticada para Fátima. Outros carnavais aqueles… sem Joel, sem Suécia, só sonhos de universitárias recém formadas. Sim, a Gi foi minha colega de facul, uma pessoa super especial. Bons tempos aqueles da faculdade – e não… Formadas, cada uma tomou seu rumo e ela casou-se, mudou para Portugal – eu sempre prometendo visitar… ela voltou para o Brasil em novembro e eu fui pisar nas terras lusitanas um mês depois.
Quando os tios do Joel nos convidaram para viajar com eles nos disseram que gostariam de ir a Portugal e perguntaram se nós tínhamos ambição de conhecer algo por lá, e eu falei de Fátima… mas eu não pensei que eles teriam vontade de visitar um Santuário Mariano; afinal, não é esse o modelo de família protestante a que eu estava acostumada – ou que meus preconceitos aceitassem que exista. Eles acharam o maior barato e incluíram Fátima no passeio para minha grandessíssima surpresa.
Não posso me descrever como uma pessoa devota mas eu vivi dentro da igreja toda a minha adolescência e carrego uma herança muito forte dessa fase da minha vida – de aspectos tanto positivos como negativos. A padroeira da cidade em que cresci é Nossa Senhora de Fátima e ainda sou uma pessoa que acredita na força da oração e da fé, como também acredito no poder de intercessão da Virgem Maria. Esse não é um blog de evangelização e o objetivo é falar da viagem, mas fica meio estranho dizer que fui a Fátima e adorei a experiência sem explicar porquê. Foi maravilhoso ir a Fátima porque vivi uma maravilhosa experiência espiritual.
Mas antes disso, comecemos do começo!
Saímos de Lisboa no domingo (de carro) e seguimos em direção a Porto de Mós – “município” em que nos hospedamos – pela rodovia que passa próximo a Santarém. A estrada era muito boa e até que achei que o pedágio não estava tão salgado (foram 3,75€ pagos em cada praça – duas – em que passamos), afinal, quem viaja nas estradas no Paraná está acostumado a deixar um absurdo nas praças de pedágio da 277. Paramos em Santarém para dar uma espiada no túmulo de Pedro Álvares Cabral – sim, para quem percebeu, fomos ver muitos mortinhos durante esse passeio – que está dentro da Igreja da Graça de Santarém.
Eu estava mais afim de pegar a estrada A8 que passaria por Óbidos do que visitar o túmulo de Cabral até encontrar um post muito interessante na internet: Pedro Álvares Cabral: três túmulos para um homem só, que vocês já podem imaginar do que se trata. Resumindo: Cabral caiu em desgraça perante o Rei Dom Manuel de Portugal e foi banido da corte; o que fez ele mudar-se para Santarém – onde não há nenhum registro sobre a vida dele até sua morte (1520). Foi enterrado e mais tarde transladado para o mesmo túmulo da esposa, no qual havia apenas a menção de seus ossos. Zé fini… até que um historiador brasileiro foi a Portugal e quase criou uma crise internacional ao afirmar que ninguém dava pelota para o túmulo de Cabral. Abriram o túmulo em 1882 e encontraram 3 ossadas (provavelmente Cabral, a mulher e um filho) e mais o esqueleto de uma cabra! Na época não havia uma maneira de confirmar que aqueles eram realmente os restos mortais do navegador mas, em todo o caso, fez-se um túmulo bonitinho em honra ao descobridor do Brasil. Só que mais de uma cidade afirma ter os restos mortais de Cabral e… bom, quem sabe?
Logo ao lado da Igreja da Graça está a Casa Brasil e acredita-se que foi lá que Pedro morou. Dentro da casa não há nada muito interessante, apesar de que é uma surpresa entrar dentro daquela construção e perceber que era realmente grande por dentro. Por fora ta meio esbagaçada e não há dentro da casa nada que lembre o séc XVI. Se é verdade que os portugueses não deram pelota para Cabral não sei mas senti falta de alguma coisa a mais no interior do imóvel (onde havia uma exposição de arte moderna, na verdade). Seria difícil tentar montar uma casa com móveis que pertenceram a um Zé Ninguém (quem brigava com o rei estava condenado a isso) e acho pouco provável que alguém tenha guardado pertences de Cabral mas seria legal entrar na casa e vê-la decorada com móveis que remontassem a época.
Depois de comer um bocadinho, paramos também nas muralhas da cidade de Santarém. A vista do alto da muralha é fantástica, mas eu mesma não tirei fotos do lado de “fora”, apenas do lado de dentro. Esses personagens vocês já conhecem…
Cortamos para oeste em direção a Óbidos mas… havia uma feira ou não sei o que na cidade que estava lo-ta-da. Não havia onde estacionar para dar um passeio a pé e entrar na cidade com carro alugado era pedir para ter problemas; por isso ficamos apenas com a vista de longe…
De lá continuamos rumo a Porto de Mós por uma via secundária, uma estrada mais estreita (sem pedágios) e com uma vista mais bonita. Demos uma última parada em Alcobaça para dar uma espiada em um mosteiro e depois, direto para nosso hotel/pousada que ficava na localidade de Livramento.
Ali conheci a Dona Maria do Céu – a dona da pousada muito papuda e simpática – e roubei mexericas ou “clementiner“; como se diz em sueco. Também ali me dei conta de que havia extraviado o adaptador para o carregador da bateria da máquina fotográfica, e a bateria com menos da metade da carga… E no outro dia iríamos a Fátima! Pá, às vezes me irrito comigo mesma.
Visitamos primeiro o mosteiro de Batalha que fica na cidade de Batalha – cerca de 15 km da pousada – mais um monumento histórico, mais túmulos de reis portugueses. Fica estupidamente claro que os tempos de glória portuguesa já se foram. Triste, eu acho. Corrupção faz muito mal para todo mundo e eu imagino o que seria do Reino Portugal se alguma vez na história seus monarcas tivessem pensado em melhores formas de investir tanto dinheiro. Batalha começou a ser construído no séc XIV e nunca foi terminado. O mosteiro foi um marco importante – assim como o quase vizinho Alcobaça – naquele tempo em que os cristãos tiraram as terras portuguesas das mãos dos mouros. Quem iniciou a construção foi Dom João I e mais sete reis viveram até que, em 1517, Dom Manuel decidiu empenhar todos seus esforços e recursos em Lisboa para a construção do Mosteiro dos Jerônimos. Ainda assim, há muito do estilo manuelista em Batalha. Atualmente, Batalha encerra dentro de si uma ala cheia de homenagens aos soldados portugueses que deram suas vidas em diferentes “batalhas” pelo mundo.
Foi então que chegou a vez de Fátima: chegamos por trás do Santuário, dei de cara com uma placa que informava os horários de missas e dos terços e para minha sorte o terço na Capela das Aparições começaria em 10 minutos. Eu tava um pouco insegura com relação a famiage, informei meio rapidinho que iria rezar o terço das doze e fugi até a Capela, meio que pensando que o povo deve achar que a Maria ficou louca… até que o Joel veio se sentar do meu lado. O sino repicou o hino de Fátima ao meio dia e rezamos o terço juntos, sentindo a paz de Deus. É lindo.
É difícil explicar porque uma coisa que não faria sentido nenhum – visitar uma velha capela onde três crianças dizem ter visto a Virgem Maria – faz tanto sentido. Se é a fé, se é porque a gente se deixa levar pelo ambiente, se é por causa da minha educação… não sei se importa: quando sentei lá e rezei o terço com os demais peregrinos foi uma das experiências mais bonitas da minha vida.
Infelizmente é só sair do Santuário para receber um choque: milhões de lojinhas de terços e imagens para todos os lados! Sério mesmo: parecem as tendinhas de Salto del Guayrá no Paraguai, todo o ambiente espiritual de paz e presença de Deus se quebra em mil pedaços com a balbúrdia dos negócios. Eu sei que tem muita gente que quer comprar lembranças de lugares santos, mas o negócio toma proporções ridículas, a ponto de um terço comum custar 5€! Pode uma coisa dessa? Pior do que isso é saber que essa cena se repete ao redor de cada Santuário – Mariano ou não – pelo mundo afora. Nessas horas dá vergonha de ser católica viu?
No meio dessa balbúrdia de lojas de artigos religiosos há, não muito longe do Santuário (cerca de 10 minutos caminhando), o museu de cera de Fátima que conta tintim por tintim a história das aparições: Lucia, Jacinta e Francisco são pastores que recebem a visita de um anjo em 1916, e no ano seguinte, a visita da Virgem Maria a 13 de maio, junho, julho, setembro e outubro. Foram 6 aparições ao todo, 5 na Cova da Iria e mais uma em Ajustrel, a 19 de agosto. Francisco e Jacinta morrem nos anos seguintes de febre espanhola (1919 e 20, respectivamente) e Lúcia torna-se irmã carmelita, morrendo aos 97 anos em 2005. Recente, não é? Ela assistiu a beatificação dos primos. A maioria dos bonecos são bons, alguns precisam visivelmente de manutenção mas com certeza, o melhor deles é o do Papa João Paulo II.
Voltamos ao Santuário e eu assisti ao final da missa das 15h; visitamos os túmulos dos pastorinhos – mais uns – no interior da Igreja do Rosário de Fátima. Por fim visitamos as casas em que viviam os pastorinhos, assim como o lugar em que lhes aparecia o anjo em 1916 – há uma linda Via Sacra no local, que fica apenas 2km do Santuário.
Como era véspera de Ano Novo compramos umas coisinhas gostosas e fizemos uma ceia da virada improvisada na pousada mesmo, assistimos aos fogos de ano novo e eu tomei um susto quando todas as sirenes e alarmes da cidade começaram a tocar a meia noite. Gente parece coisa de guerra, dá uma sensação de pânico e como a eu nunca tinha ouvido isso fiquei em dúvida pensando se era para correr e se esconder mesmo ou era para comemorar…
No último dia na região visitamos a Gruta de Mira de Aire, uma caverna descoberta em 1947. A Serra dos Candeeiros é muito porosa e tem rios subterrâneos. Descemos 683 degraus e ficamos enterrados a 110 metros. Na gruta há um rio conhecido como Rio Negro e até mesmo o Poço da Sogra – um buraco que lembra um poço com 35 metros de profundidade. Ao todo a gruta tem mais de 11km de extensão, e ainda há vias e mais poços que não foram explorados. O passeio percorre cerca de 500m de extensão da gruta e ao fim, subimos com elevador.
Na tarde do dia primeiro voltei a Fátima com os tios do Joel enquanto ele e as irmãs foram conquistar a montanha de Santo Antônio. E não é que descobrimos o caminho de Santiago de Compostela português?
O dia seguinte foi tomar a estrada de volta a Lisboa, voos até Göteborg, capotar na cama exausta. Com a viagem aprendi um monte de histórias interessantes desse país e voltei para casa com uma impressão maravilhosa de Portugal. Estou torcendo para que o país consiga emergir da crise.
Certeza que volto para lá. Já recebi até convite (de novo!) para conhecer Algarve!